O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino propôs em decisão de uma ação a fixação de uma tese para que o crime de ocultação de cadáver não seja alcançado pela Lei da Anistia, sancionada em 1979. A legislação mobilizou amplos setores da sociedade brasileira, que pressionavam à época pela abertura e a redemocratização do país.
Ao analisar um caso concreto, sobre o desaparecimento de militantes na Guerrilha do Araguaia, Dino apresentou aos colegas da Corte a tese de que o sumiço dos corpos, sem a possibilidade de sepultamento pelas famílias, é um crime permanente. Não poderia, portanto, ser perdoado.
Ao argumentar, Dino citou o filme “Ainda Estou Aqui”, que conta o drama de uma família após o desaparecimento do ex-deputado Rubens Paiva, assassinado pela ditadura em 1971, cujo corpo nunca foi encontrado.
“O crime de ocultação de cadáver tem, portanto, uma altíssima lesividade, justamente por privar as famílias desse ato tão essencial. No momento presente, o filme “Ainda Estou Aqui” – derivado do livro de Marcelo Rubens Paiva e estrelado por Fernanda Torres (Eunice) – tem comovido milhões de brasileiros e estrangeiros. A história do desaparecimento de Rubens Paiva, cujo corpo jamais foi encontrado e sepultado, sublinha a dor imprescritível de milhares de pais, mães, irmãos, filhos, sobrinhos, netos, que nunca tiveram atendidos os seus direitos quanto aos familiares desaparecidos. Nunca puderam velá-los e sepultá-los, apesar de buscas obstinadas como a de Zuzu Angel à procura do seu filho”, escreveu o ministro do STF.
Agora, os demais ministros irão se manifestar, em plenário virtual, sobre a questão e definirão se o tema terá repercussão geral. Ou seja, valerá para todos os casos relacionados.
No caso concreto analisado por Dino, o Ministério Público Federal apresentou, em 2015, denúncia contra Lício Augusto Ribeiro Maciel e Sebastião Curió Rodrigues de Moura, ambos tenente-coronel do Exército, buscando a condenação pelos crimes de homicídio qualicado (Lício) e ocultação de cadáver (Lício e Sebastião) cometidos durante a Guerrilha do Araguaia.
A denúncia não foi recebida, sob o argumento de que os crimes em questão foram perdoados pela Lei da Anistia. Ainda em 2015, o MPF recorreu ao Tribunal Regional, onde o entendimento do tribunal inferior foi mantido. Em 2024, um Recurso Extraordinário apresentado pelo MPF foi admitido pelo Supremo Tribunal Federal, sob relatoria de Dino.
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