Ato é marcado por gritos de campanha e por elogios a Pimenta, potencial candidato a governador e que assumirá ministério da reconstrução
Por Folha de São Paulo
O presidente Lula (PT) anunciou nesta quarta-feira (15) medidas para socorrer famílias do Rio Grande do Sul em evento com tom de comício em meio às enchentes que destruíram casas e cidades.
O ato ocorreu em São Leopoldo, maior município governado pelo PT no estado, a cerca de 35 km de Porto Alegre e um dos mais afetados pela tragédia.
Lula vista abrigo na universidade Unisinos antes de evento em que anunciou medidas para o estado – Pedro Ladeira/Folhapress
O evento foi marcado por gritos da plateia geralmente usados em campanhas petistas e por elogios a Paulo Pimenta, que é potencial candidato a governador em 2026 e foi nomeado para comandar a pasta extraordinária de reconstrução do RS.
Lula disse que pretende viver até os 120 anos, que ainda precisa “disputar umas dez eleições” e que estará “de bengala disputando eleição”.
A ministra da Saúde, Nísia Trindade, fez duras críticas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sem citá-lo nominalmente, e o ministro da Casa Civil, Rui Costa, lembrou que já fez campanha eleitoral para Pimenta.
O tom do ato ocorre após aliados do presidente apontarem que a escolha do ministro extraordinário por Lula tem o objetivo de manter no estado um ator político para defender as ações do governo e, assim, evitar que o governador Eduardo Leite (PSDB) se catapulte com recursos federais.
A indicação de Pimenta acabou dividindo alguns dos aliados e mesmo ministros do governo, que defendiam um nome “despolitizado”, para não criar ruídos e atrapalhar os esforços emergenciais e de reconstrução.
Ministro da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República) desde o começo do governo, Pimenta migrará temporariamente para o comando da recém-criada Secretaria Extraordinária para Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul.
A indicação enfrenta resistência nos bastidores, tanto da parte de aliados de Lula como de Eduardo Leite. Há receios com uma politização da calamidade climática e possível abertura de palanque para as eleições de 2026.
Pimenta é gaúcho, tendo sido vice-prefeito de Santa Maria e eleito para sucessivos mandatos pelo estado na Câmara dos Deputados.
Outras autoridades, como o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, e dez ministros de Lula estavam presentes.
O governador Eduardo Leite afirmou que às vezes as pessoas podem ficar “chateadas” com solenidades, mas que elas são importantes para gerar esperança no futuro e comemorar avanços para combater a crise.
Antes do ato, realizado na Unisinos, uma das maiores universidades privadas do país, Lula visitou um abrigo e conversou com pessoas atingidas pelos alagamentos.
O petista anunciou o programa batizado vale reconstrução, que dará R$ 5,1 mil a famílias atingidas para investir na compra de itens perdidos com as enchentes. Também afirmou que 21 mil novas famílias serão incluídas no Bolsa Família.
O Executivo federal afirmou que irá oferecer, como antecipou a Folha, domicílios a atingidos que se encaixarem nas faixas um e dois do Minha Casa, Minha Vida, que são voltadas a famílias de mais baixa renda.
A ministra da Saúde lamentou a disseminação de fake news em meio à tragédia e criticou Bolsonaro.
“A partir da sua eleição [Lula] e da constituição do nosso governo, o Ministério da Saúde volta a fazer aquilo que sempre deveria ter feito e não foi feito durante a pandemia da Covid-19, que é coordenar todo esforço nacional para salvar vidas”, disse Nísia.
Lula afirmou que se surpreendeu com a quantidade de negros no estado. “Por mais que a gente veja, eu falei para Janja domingo, é impressionante, eu não tinha noção que no Rio Grande do Sul tinha tanta gente negra.”
Rui Costa afirmou que, no ministério extraordinário, Pimenta “não será o executor da obra, porque cada ministério o fará, mas terá a função nobre de articular com a sociedade, empresários e prefeito para fazer as coisas acontecerem”.
A comunicação do governo foi alvo de críticas do próprio Lula. Por isso repetidas vezes se aventou que voltaria à chefia a Secom o prefeito de Araraquara, Edinho Silva, que já ocupou o cargo no governo Dilma Rousseff.
Interlocutores no Palácio do Planalto afirmam que a escolha para a pasta voltada ao RS foi tomada em um círculo pequeno no entorno do presidente. O próprio Pimenta teria pressionado para assumir o cargo. E a indicação dividiu alguns aliados, tanto no Congresso Nacional como na Esplanada dos Ministérios.
Alguns apontam que a nomeação de um político tem o objetivo de manter no Rio Grande do Sul um quadro com força para defender as ações do governo e ajudar a controlar a narrativa sobre medidas tomadas, recursos empregados e sobre a responsabilidade por falhas.
Há também a avaliação de que a politização da tragédia já teria partido de Leite, que estaria evitando citar o nome de Lula em suas falas.
Além disso, apontam que a indicação de Pimenta pode ajudar a aproximar o governo Lula de um estado onde o PT já teve destaque, à frente de prefeituras importantes e do Palácio Piratini, mas que se tornou mais conservador e uma das bases do bolsonarismo.
Por outro lado, uma ala defendia um nome “despolitizado” para ocupar o cargo. Afirmam que a medida pode acabar provocando críticas ao governo federal, por tentar tirar proveito político de uma tragédia.
Tucanos viram com preocupação a nomeação de Pimenta e reclamaram que Leite não foi consultado nem avisado da decisão, como mostrou a coluna Painel.
“Nós não vamos permitir que isso sirva de palanque eleitoral”, diz o deputado Lucas Redecker (PSDB-RS).
O deputado Aécio Neves (PSDB-MG) chamou de indelicadeza do governo a decisão de indicar Pimenta sem antes conversar com Leite e criticou a escolha.
“O governador ficou sabendo que era o Pimenta conversando comigo no telefone. Isso [a criação do ministério] começa com um gesto de indelicadeza num momento como este.”
Aécio chamou ainda de “violência federativa” e “imprudência” a escolha de Pimenta, por se tratar de um adversário de Leite e potencial candidato ao governo do estado.
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