Dois meses após a denúncia da personal stylist Sílvia Tavares, mais uma mulher afirma ter sido estuprada pelo padre Airton Freire, criador da Fundação Terra, em Arcoverde, no Sertão de Pernambuco. Preso preventivamente desde 14 de julho, o religioso de 67 anos é alvo de cinco inquéritos e está internado num hospital no Recife, com “princípio de acidente vascular cerebral”.
Em entrevista à TV Globo, a mulher, que pediu para não ser identificada, disse que, após ser levada por um funcionário da Fundação Terra até a casa de taipa onde o religioso dormia, Padre Airton pediu para ela fazer uma massagem nele. As informações são do portal G1/PE.
“Quando ele segurou meu braço, eu disse: ‘Vou me embora’. Ele disse: ‘Cuidado’. Eu disse: ‘Com o quê?’, e ele respondeu: ‘Com os cachorros, cuidado quando passar na frente do canil que você pode ser estraçalhada’. Aí eu me virei, botei o dedo na cara dele e disse assim: ‘Quem cuida de mim não dorme, não. Está pensando que eu tenho medo de vocês dois? Eu não tenho medo, não’. Dei as costas e fui me embora. E ele ainda disse assim: ‘Não olhe para trás’. Esperei levar um tiro, esperei ele soltar os cachorros. […] Era tão escuro e era longe, e eu fiquei tão desesperada”, contou a mulher.
Ela disse que, ao chegar à “casinha”, como o lugar era chamado, o padre apareceu sem roupa. “Eu disse: ‘Padre, pelo amor de Deus, padre, se vista, se cubra, padre… Meu Deus, o que é que está acontecendo aqui?’ O capanga disse o seguinte: ‘Olha, o que acontecer aqui vai ficar aqui. Você pode fazer o que você quiser com a gente, que vai ficar aqui’. Aí, o padre começou a se masturbar. Rindo”, relatou a mulher.
A mulher contou que foi apresentada a Padre Airton por uma amiga há mais de dez anos. A partir daí, começou a frequentar os retiros na Fundação Terra. “E cada vez mais eu sentia necessidade de ir, eu comecei a ajudar a obra com que eu podia, descontava do meu cartão de crédito mensalmente, eu fui aumentando os valores, o que eu podia fazer, eu queria levar e levar mais pessoas. […] Eu acreditava tanto nele, mas tanto, tanto, que me dói a cegueira”, disse.
Após fugir da casinha, a mulher relatou que foi até o quarto onde estava hospedada, de onde conseguiu falar com uma amiga. “Ela disse assim para mim: ‘Onde é que você está agora?’ ; ‘Eu estou dentro do quarto’; ‘Está tudo trancado?’; ‘Tá!’; ‘Tem como ir embora daí agora?’. Eu disse que, para ir embora, ia ter que pedir um carro. Ela disse: ‘Então, você não vai embora. E você não vai fazer nada’, porque eu disse a ela que a minha vontade era ir na hora do terço chegar lá e escancarar para todo mundo quem era ele. Aí ela: ‘Você não vai fazer isso porque você está dentro da casa dele. Ele pode dar fim à sua vida, e ninguém nunca vai saber. Você vai ficar dentro do quarto, você não vai falar com ninguém’. Essa amiga salvou a minha vida”, disse a mulher, que saiu do retiro no dia seguinte.
Um homem que trabalhou com o Padre Airton Freire disse que também foi vítima de estupro na Fundação Terra. Sem se identificar, o homem contou que acredita ter sido dopado e, horas depois, acordou na casa de taipa onde o padre dormia, dentro da propriedade da Fundação Terra.
“Teve uma noite que ele colocou alguma coisa na garrafa d’água que ficava em cima de uma mesinha […]. Peguei a garrafa umas 11 e pouca da noite. Tomei a água e me deitei na rede. Quando foi [por volta das] 5 e pouca da manhã, eu me acordei numa cadeira, que tem próximo da mesinha, só de cueca. E senti meu corpo, né? A gente sente o corpo da gente diferente. Não lembrei [o que aconteceu]”, disse.
O ex-funcionário disse que trabalhava “tomando conta” do padre, por quem tinha uma “consideração de pai”. Segundo ele, o religioso já tinha tentado dopá-lo outras vezes. “Dormia com ele, dava remédio. Às vezes, ele ficava gritando à noite, como se o demônio estivesse dando nele. Mas acho que era só uma forma de me manipular. Até ele conseguir, né? Porque ele tentou algumas vezes me dopar e eu consegui ver”, contou.
O homem disse também que “outros meninos enlouqueceram” por causa dos abusos praticados pelo padre. “Eu achava que era uma missão, para mim, fazer com que ele se endireitasse e fosse para o caminho certo, e sendo um verdadeiro servo de Cristo. Mas ele não me ouvia, dizia que eu estava louco, que eu estava com uma ‘legião de demônios’. E eu sabia, sim, que ele fazia isso com outras pessoas, mas achava que era uma missão que Deus estava me dando”, relatou.
Ainda de acordo com o ex-funcionário, há muitas vítimas que não têm coragem de falar, com medo, por falta de condições financeiras e uma “família estruturada” para levar o caso adiante. “Eu digo, porque eu convivi com ele, não foi ninguém que disse. Eu vivi com ele. Eu achava que era uma missão que eu tinha, de colocar ele no caminho certo. Mas, na verdade, ele se aproveitou disso também, da ingenuidade, do meu lado de querer aprender o lado religioso. Usou isso contra mim e fez uma psicologia reversa, [vamos] dizer assim”, afirmou o homem.
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