Leão Serva - Folha de S.Paulo
A foto é expressiva: duas cabeças brancas dominam completamente o quadro em cujo fundo se vê o povo disciplinado, a maior parte com uniforme vermelho. De tão perto, a imagem do ex-presidente é uma metáfora da condição petista: Lula perde cabelos, como seus comícios se tornam cada vez mais ruços.
Em seu discurso, Lula ataca um adversário mais novo (o prefeito João Doria): "Ele saiu do nada"; "Eu queria que ele governasse São Paulo, só isso. Primeiro ele vai ter que comprovar que ele pode fazer. Uma coisa é gerir quitanda, outra coisa é gerir uma cidade", disse, conforme o relato da Folha. O discurso do líder trabalhador envelheceu, mais ainda do que a passagem dos anos. O ex-presidente se transformou em um Paulo Maluf do PT, usando os mesmos argumentos que décadas atrás seu então adversário figadal lançava contra ele.
Para esconder a inversão de sinal, Lula cria um simulacro de si mesmo. A caravana pelo Nordeste é uma remontagem daquela que se seguiu à derrota para Fernando Collor, em 1989, quando saiu da depressão em um ônibus pelo interior do país aplainando o longo caminho para o Planalto. Em 1991, assisti sua passagem por Xapuri, no Acre, onde até eleitores de Collor queriam tocar a grande figura que visitava a cidade. O jovem Lula provocava devoção semelhante às imagens de santos.
Hoje a realidade é inversa: visita a Bahia, governada pelo PT, de braços com seu atual oligarca. A seu lado não está o sindicalista Jacques Wagner mas o coronel que ocupa o lugar que antes foi de Antonio Carlos Magalhães, o Toninho Malvadeza, chamado "Cabeça Branca" em jingles apaixonados. Não é só a cor dos cabelos, até a roupa branca o líder petista pegou do antecessor no posto de "dono da Bahia".
O resto da caravana vai ser igual: Lula vai percorrer os Estados do Nordeste brasileiro de braços dados com novas e velhos oligarquias regionais, até chegar ao paroxismo de visitar o Maranhão com apoio do novo governador, do PCdoB, e da família Sarney, fora do governo estadual mas sempre com um pé no poder.
Por essa estranha aliança de interesses senis, o discurso de classe dos anos 1980 já não fica bem: Lula agora fala mal de São Paulo, insuflando uma disputa regional que, se radicalizada, pode vir a fazer muito mal ao Brasil. Se o "nacionalismo é o último reduto dos canalhas", o regionalismo deve ser um reduto dos velhacos.
Há outras semelhanças entre Maluf e o Lula de hoje: perseguidos por acusações de corrupção ambos repetem negativas semelhantes; como Saturnos, dominam seus partidos castrando ou engolindo as lideranças independentes; depois de exibições de grande popularidade, ambos têm agora que fugir dos fantasmas dos "postes" que criaram (Celso Pitta e Dilma Rousseff); depois do fracasso dos epígonos, os dois se tornaram campeões das pesquisas antecipadas mas têm de enfrentar o teto imposto pelas taxas de rejeição (no caso de Maluf, as várias derrotas serviram para mostrar como os resultados de pesquisas antes da hora são ilusórios).
A aliança recente entre os dois, eternizada em fotos de quando abençoaram a candidatura de Fernando Haddad, só torna mais patente a coincidência dos espíritos. Lula mexe com a memória do folclore político brasileiro quando ataca alguém por inexperiente. Só falta repetir o slogan de Maluf: "Foi Lula que fez". Ou como outro político mais antigo: "...Mas o Lula faz!"
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