As cenas de invasão às sedes dos três Poderes registradas em Brasília neste domingo, protagonizadas por centenas de manifestantes golpistas que apoiam o ex-presidente Jair Bolsonaro, podem ser enquadradas judicialmente por crimes contra as instituições democráticas e por associação criminosa, entre outros.
Esta é a avaliação de juristas e advogados constitucionalistas consultados pelo Globo na noite deste domingo (8), após as forças de segurança terem conseguido expulsar os manifestantes que invadiram e depredaram o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o prédio do Supremo Tribunal Federal (STF).
Na avaliação do constitucionalista Pedro Serrano, há pelo menos três condutas criminosas que podem ser imputadas aos participantes dos atos golpistas: abolição violenta do Estado Democrático de Direito, associação criminosa e dano ao patrimônio público.
A primeira conduta é caracterizada, de acordo com o Código Penal, pelo uso de "violência ou grave ameaça, (...) impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais". De acordo com Serrano, também é possível caracterizar os atos como crime de golpe de estado. As penas para duas essas práticas, somadas, podem chegar a 20 anos de prisão.
O jurista também ponderou que, embora os atos possam ser chamados de forma leiga como "terroristas", a legislação brasileira classifica terrorismo como os atos "cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado", que envolvam razões como "xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião".
-- Nos atos de Brasília, observei mais a intenção de ataque aos poderes constituídos, o que caracteriza os crimes contra a democracia, do que gerar terror generalizado. A não ser que sejam encontrados objetos como bombas -- avaliou Serrano. -- São crimes graves, com penas graves e concurso material, isto é, as penas se somam. As autoridades que se acumpliciaram também podem responder por crimes contra a administração pública, como prevaricação. E aquelas que tiveram o que chamamos de "omissão comissiva", dolosa, podem caracterizar co-autoria nos crimes contra a democracia.
Professor de Direito Constitucional na PUC de São Paulo, o advogado Georges Abboud também classificou que os atos configuram "ação criminosa contra o Estado Democrático de Direito, que somente foi possível em virtude da leniência e complacência de instituições e agentes públicos". Por conta disso, Abboud considerou acertada a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de decretar intervenção federal na segurança pública do Distrito Federal.
O advogado criminalista Rodrigo Faucz Pereira e Silva pontuou que a responsabilização judicial pelos atos golpistas deve englobar não só os invasores das sedes dos Poderes, mas também "aqueles que apoiaram, instigaram e financiaram esta tentativa de enfraquecimento das instituições democráticas".
O crime de associação criminosa, mencionado pelos especialistas, pode render pena de um a três anos de prisão, de acordo com o Código Penal.
A legislação também considera o crime de dano ao patrimônio agravado quando é cometido contra bens da União. Os atos golpistas deste domingo deixaram um rastro de destruição no Congresso, no Palácio do Planalto e no STF, inclusive com danificação de obras de arte e objetos de valor histórico.
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