Prestígio com Bolsonaro agrada, mas também preocupa cúpula militar
Oficiais generais temem que Forças Armadas virem vidraça ou sejam associadas a fracassos num eventual governo do capitão.
Foto: Brasil247
Folha de S. Paulo
Por Igor Gielow
Discussões tópicas como aumento de salários serão vistas como favorecimento.
Visando criar salvaguarda, a Defesa negociou com Bolsonaro a manutenção da equipe que faz a interlocução do ministério com o Legislativo.
Assim, acredita, será possível marcar posições distintas das defendidas pela bancada governista, se necessário. A eventual inclusão de militares em uma reforma da Previdência seria alvo de tal lobby.
Outro ponto nevrálgico é a agenda da área de segurança pública que deverá ser apresentada ao Congresso se o deputado do PSL for eleito. Um general se diz preocupado com o que chama de generalização nas manifestações de Bolsonaro sobre o tema.
Na semana passada, por exemplo, o candidato defendeu a isenção de julgamento a PMs que matam em serviço.
O Exército demorou anos para emplacar a lei que transferiu da Justiça comum para a militar o julgamento de soldados que matam em ação nas operações de Garantia da Lei e da Ordem. A Força foi alvo de inúmeras críticas.
Para o general, além de incorreta juridicamente, a sugestão bolsonarista dá a entender à população que os militares querem carta branca para matar, e não o que consideram segurança jurídica.
Falas desastrosas, especialidade no campo bolsonarista, estão no radar.
Neste domingo (21), causou ruído a divulgação do vídeo de um dos filhos de Bolsonaro, o deputado reeleito Eduardo, dizendo que seria possível fechar o Supremo Tribunal Federal apenas com “um soldado e um cabo”.
Na semana passada, o Judiciário já havia sido alvo de um general eleito deputado. Colocações como a do vice de Bolsonaro, Hamilton Mourão (PRTB), sugerindo intervenção militar preocupam por serem bem recebidas especialmente nas camadas médias e baixas do meio militar.
O outro ângulo do risco é mais prosaico. O eventual fracasso de um governo associado aos quartéis poderá se refletir na boa imagem que as Forças têm junto à população.
Segundo o Datafolha mediu em junho, 78% dos brasileiros dizem confiar nelas, o maior índice entre dez instituições apresentadas.
A militarização de um governo Bolsonaro é uma de suas bandeiras. Além de ele mesmo, seu vice é um polêmico general de quatro estrelas que só deixou a ativa neste ano.
Outra ponte está estabelecida com o Judiciário. O presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, assumiu em setembro e levou para sua assessoria pessoal o general Fernando Azevedo e Silva, que tem ótimas relações com Mourão e Heleno.
Para críticos, a impressão é de interferência indevida. Já apoiadores veem no movimento uma linha direta para momentos turbulentos.
Se ponderam sobre essas questões, os militares ouvidos concordam que Bolsonaro é o candidato do meio.
Após 33 anos de recolhimento pós-ditadura, oficiais não escondem satisfação pela deferência pública.
É entusiasmado o apoio nos quartéis e, aos poucos, Bolsonaro foi abraçado nas cúpulas —há um ceticismo maior na Marinha e na Força Aérea, que temem protagonismo do Exército de onde ele saiu em 1988 para ser vereador no Rio.
O PT adotou programas de rearmamento, mas em 2015 a relação com a caserna desandou quando o então ministro da Defesa Jaques Wagner (PT-BA) retirou dos comandantes prerrogativas como promoções de oficiais generais.
Wagner recuou, mas o estrago foi feito, abrindo espaço para a ascensão de um Bolsonaro já em pré-campanha.
No Alto Comando do Exército, o centro de gravidade da Defesa no Brasil, o apoio acabou selado em 2017 com a incorporação de generais da reserva à equipe bolsonarista.
Os comandantes vêm tentando combater a associação a Bolsonaro, inevitável, por meio de reiteradas manifestações de apartidarismo.
No segundo turno, o Comando do Exército falou com Bolsonaro e com o ex-ministro da Defesa Nelson Jobim (governos Lula e Dilma), este para azeitar canais com Fernando Haddad (PT).
Um termômetro para avaliar a manutenção dessa prudência será a escolha dos novos comandantes, a começar pela substituição do chefe do Exército, Eduardo Villas Bôas, que deverá ser costurada antes da posse do eleito.
Entre os quatro generais de quatro estrelas mais antigos, todos da turma do presidenciável na academia de oficiais, o nome de Mauro Cid (diretor de Educação do Exército) ganhou destaque em Brasília.
A militarização começou com Michel Temer. Governando um Planalto progressivamente enfraquecido, o emedebista viu crescer a influência do chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Sérgio Etchegoyen.
Colocou outro general de quatro estrelas, Joaquim Silva e Luna, pela primeira vez no comando da Defesa.
Como diz um ministro próximo do setor e outros políticos, há ainda a mão inversa: a politização do meio militar, aumentando disputas e o potencial de sublevação —o que leva a associações com a ditadura instaurada em 1964.
Eles desconsideram o risco de um golpe clássico, mas não descartam a tutela do poder civil, temor que a cúpula militar que dissipar.