Vinicius Mota - Folha de S.Paulo
No início do ano, quando a autoridade presidencial começou a desabar, a meta realista de Dilma Rousseff era terminar o segundo mandato como Fernando Henrique, com popularidade baixa, mas no controle do Congresso. Agora o "benchmark" baixou para José Sarney.
Na metade final de sua administração, o primeiro presidente da democratização era governado pelo Legislativo e pelos fatos. Galopava sobre seus ombros uma crise inflacionária de fazer lembrar a do Zimbábue sob Robert Mugabe.
Na campanha de 1989, Sarney apanhou dia sim, outro também, de todos os candidatos à Presidência. Manteve, contudo, a fleugma. Evitou revanchismos e aventuras institucionais num momento em que o tecido do novo regime ainda era frágil.
Houvesse resistido à tentação de reembarcar na política oligárquica depois de deixar o Planalto, sua imagem de "estadista" estaria preservada. Perdeu pontos, de todo modo, não pela conduta adotada durante o mandato presidencial.
Dilma ainda precisa melhorar para chegar a Sarney. Falta a ela o que talvez tenha prevalecido no caso dele: desprendimento para lutar por reconhecimento mais generoso da História dentro do agudo ângulo de manobra oferecido pelo presente.
Agarrada como está a personagens hamletianos, que entram em cena para matar e morrer, a presidente não vai longe. Poderá terminar o mandato, pois a contingência é hoje a rainha da trama, mas sua biografia será reduzida a pó de traque.
Em vez de digladiar-se pela CPMF, Dilma poderia gastar o mesmo capital político escasso numa reforma profunda da Previdência, que garanta sua solvência, e a do Estado brasileiro, ao longo do século.
Nesse caso, precisaria mudar de interlocutores e aliados. Não é com a raia miúda da Câmara que vai chegar lá. Tampouco teleguiada por Lula, obcecado apenas com a própria sobrevivência.